Produção de carros deve perder ritmo até o fim do ano

Chamou a atenção na semana passada a revisão das metas traçadas pela indústria automobilística para 2013, com corte na expectativa de vendas, mas indicando uma produção bem superior ao volume inicialmente projetado pelos fabricantes.

Se, de um lado, os novos números comprovam a mudança de uma leitura extremamente positiva sobre a capacidade do mercado de superar os volumes históricos de 2012, por outro, mostram que a indústria superestimou o impacto da recessão europeia e de um cambio que ainda se mostrava pouco competitivo no início do ano.

Na contramão das expectativas iniciais, a inesperada retomada das exportações, combinada à substituição de carros importados por nacionais, foi um dos motores para a alta de quase 14% na atividade das fábricas de veículos no acumulado de janeiro a agosto. Isso fez a Anfavea, entidade que representa as montadoras, anunciar na quinta-feira um salto na estimativa de crescimento da produção em 2013: de 4,5% para 11,9%.

Por outro lado, a previsão de crescimento das vendas, que antes variava de 3,5% a 4,5%, caiu para a faixa de 1% a 2%, mais alinhada às expectativas da Fenabrave, a entidade das revendas. Ainda assim, os números seguem mais otimistas se comparados a projeções feitas por analistas independentes que chegam a apontar queda nos licenciamentos. Mas diferente de qualquer leitura positiva que a nova meta de produção possa sugerir – ou negativa, no caso das vendas -, a Anfavea, na verdade, indicou na atualização de seus cálculos uma desaceleração na atividade das fábricas para o restante do ano.

A produção das montadoras, que chegou a encostar em 350 mil em abril e maio, além de superar 340 mil unidades no mês passado, entra agora em uma fase de resultados mais moderados, com um ritmo mensal ao redor de 320 mil veículos, conforme contas feitas com base nas previsões divulgadas pelos próprios fabricantes.

A produção prevista para os últimos quatro meses de 2013 – 1,28 milhão de veículos – ainda supera em 8,4% o total de igual período do ano passado, um bom número, mas que não repete o ritmo de 13,7% mostrado até agosto.

Alguns analistas, porém, falam em desaceleração ainda mais acentuada, tendo em vista o alto nível dos estoques na rede. Como nem toda a produção de agosto – a maior para o mês na história – foi absorvida pelo mercado, os veículos parados nos pátios das fábricas e de concessionárias cresceram no mês passado. No fim de agosto, passavam de 400 mil veículos, o equivalente a 36 dias de venda, quando o ideal, segundo dizem analistas, revendedores e executivos das próprias montadoras, seria um nível mais próximo a 30 dias.

Relatório divulgado pelo Bank of America Merrill Lynch após a divulgação dos estoques da indústria automobilística em agosto avalia que os números aumentaram a possibilidade de desaceleração mais aguda das taxas de produção durante este semestre.
"Uma redução mais abrupta dos volumes produzidos tende a ser pior para as empresas do que uma redução gradual, já que nesse cenário elas não têm tempo suficiente para ajustar sua estrutura de custos, prejudicando margens", diz o texto do BofA Merrill Lynch assinado pelos analistas Murilo Freiberger, Sara Delfim e Roberto Otero.
A consultoria GO Associados também é mais conservadora do que a Anfavea. Prevê um crescimento de 7% da produção, como resultado de uma alta estimada em quase 2% nas vendas de veículos fabricados no Brasil e do avanço de 26% projetado para as exportações. Já para o Deutsche Bank, um desempenho melhor do que o esperado neste ano provavelmente significará uma produção mais fraca entre 2014 e 2015.

Já quando se avalia a tendência de vendas, o mercado, daqui para frente, terá que voltar a níveis superiores a 340 mil veículos por mês – o que, neste ano, só aconteceu em julho – para alcançar até o fim do ano a estimativa mínima de crescimento traçada pela associação das montadoras. Nas contas da entidade, o setor automotivo, que em agosto inverteu a trajetória de crescimento e passou a mostrar queda de 1,2% nas vendas, vai crescer a um ritmo acima de 5% nos quatro últimos meses do ano, ante igual período de 2012.

Para alguns analistas, contudo, esse desempenho se tornou inviável diante de fatores como a acomodação do consumo, o aumento dos juros e a queda na confiança do consumidor. Em meses como outubro e dezembro – que, em 2012, foram marcados por corrida de consumidores às concessionárias, dada a possibilidade da retirada de descontos no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) -, a indústria também vai se deparar com uma forte base de comparação, tornando mais difícil registrar boas taxas de crescimento.

"O grande impacto, na verdade, ocorrerá em função do ótimo fim de ano de 2012 que tivemos. Não alcançaremos as médias de 2012 neste fim de 2013, o que motivará a redução dos resultados deste ano", diz Milad Kalume Neto, analista da consultoria Jato Dynamics. Ele prevê que o mercado, graças ao desempenho dos veículos comerciais, fechará 2013 quase no mesmo nível do ano anterior, marcando leve aumento de 0,3%.