Governo adia reunião sobre combustíveis
Sem consenso sobre a fórmula de reajuste dos combustíveis, o governo adiou para o dia 28 a reunião do conselho de administração da Petrobras. O ministro da Fazenda e presidente do conselho, Guido Mantega, disse que a intenção é "preparar melhor os temas da pauta". A reunião estava marcada inicialmente para amanhã, dia 22, e o tema da pauta é a nova metodologia de reajuste. Mantega não adiantou as nuances da discussão e se negou a falar sobre o aumento da gasolina e do diesel.
A correção de preços ainda não está definida, mas pode chegar a 7%, segundo apurou o Valor. Seria um "reajuste seco", concedido em dezembro. A intenção é que o efeito sobre a inflação seja diluído nos meses seguintes ao reajuste. A promessa do governo é que a inflação termine o ano abaixo dos 5,84% acumulados em 2012. Até outubro o IPCA acumula variação de 4,38%.
Hoje, a defasagem nos preços da Petrobras é maior no diesel do que na gasolina e o reajuste que será autorizado deve seguir essa lógica – cerca de 5% para a gasolina e um percentual mais próximo de 10% para o diesel.
Os primeiros impactos da nova fórmula de correção dos combustíveis, no entanto, só deverão ser sentidos a partir do fim de março. A intenção é que a avaliação da necessidade de reajuste seja feita a cada três meses. A Petrobras defende que o repasse seja automático, mas em função do ano eleitoral, e com a inflação rondando o teto da meta, discute-se a manutenção de algum tipo de discricionariedade sobre o preço dos combustíveis.
A estatal quer trabalhar com cotações internacionais do petróleo e com taxa de câmbio, mas também incorporar à fórmula de reajuste alguma variável que reflita os custos de transporte. Os gastos com frete, no entanto, são considerados uma variável complicada para incorporar ao modelo. Prevalece a ideia de estabelecer uma faixa de flutuação de preços dentro da qual não haveria repasse aos consumidores. Se o preço dos derivados se afastar dessa banda, o reajuste seria aplicado.
As relações entre a presidente da Petrobras, Graça Foster, e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, não estão das melhores. Segundo esse interlocutor, a presidente da estatal tem sido "dura" na demanda por reajuste e "jogou pesado" quando anunciou que haveria uma fórmula de reajuste automático nos preços.
A discussão pública incomodou o ministro, que tem insistido desde então que não há prazo, percentual ou fórmula definida. Já para a Petrobras, era essencial dar algum sinal ao mercado depois dos resultados financeiros ruins do terceiro trimestre. Ontem, depois que o ministro já havia anunciado o adiamento da reunião do conselho administrativo, a assessoria de imprensa da estatal informou que não comentaria o assunto.
A decisão de segurar os preços dos combustíveis para frear a inflação vem de 2010. Mas os efeitos sobre o caixa da empresa são hoje considerados um custo excessivamente elevado dessa política.
A defasagem de preços acumulada pela Petrobras chega a R$ 50 bilhões e a recomposição do caixa da estatal levará tempo. A ideia de uma fórmula para reajustar os preços tem a intenção de permitir que esse ajuste seja feito com menor interferência do governo.
No embate, mercado torce por Graça – Desde que a Petrobras informou, no dia 25 de outubro, que propôs uma fórmula de reajuste dos preços dos combustíveis, ficou claro que existe uma queda de braço entre o ministro da Fazenda e chairman da estatal, Guido Mantega, e a presidente da Petrobras, Graça Foster, que claramente tem um poder de persuasão junto à presidente Dilma Rousseff que seu antecessor nunca sonhou ter.
Enquanto Mantega dá sinais trocados ao mercado sobre a proposta – ora enfatiza o temor de indexação, ora defende uma discussão mais acurada sobre a metodologia -, Graça está diante da tarefa hercúlea de convencer o governo a dar meios para que a Petrobras possa dobrar de tamanho de forma a manter seus indicadores saudáveis, considerando que vai precisar de muitos bilhões de dólares para colocar o petróleo do pré-sal nas bombas de gasolina. O mercado torce por Graça Foster, como sugere a recente recuperação vista no preço das ações.
O embate surdo entre ambos e o adiamento da reunião que aconteceria na sexta foram interpretados como sendo um fôlego para a Fazenda obter uma fórmula que seja "um meio termo entre a total incerteza, como é hoje, e uma regra bem mais ou menos", avalia um observador, nos Estados Unidos. Para esse observador, a situação também indica que Mantega "perdeu o poder de veto que tinha".
A sinuca em que a Petrobras e o governo se encontram também surpreende. Analistas vêm observando nas últimas semanas que se era para "lavar roupa suja em público" – como estão sendo vistas as manifestações da Fazenda – o melhor seria que a Petrobras não tivesse anunciado ao mercado a intenção de adotar uma fórmula. Agora, qualquer coisa menos que um reajuste e um novo mecanismo pode levar a uma queda das ações e, no limite, a uma reavaliação das agências de classificação de risco talvez em velocidade mais rápida do que viria antes.
Por outro lado, há um temor de que a alternativa seja a adoção de um modelo tão amplo, que dê tanta margem de manobra ao governo (como por exemplo uma banda muito larga de preço ou um período de reajustes superior a 3 meses), que acabe sendo neutro para a Petrobras e incapaz de resolver o problema de caixa e de alavancagem da companhia.
Em boletim distribuído ontem pela consultoria Eurasia Group, os analistas João Augusto de Castro Neves, Christopher Garman e Jefferson Finch avaliam que ao invés de aceitar uma regra automática para reajustar os preços dos combustíveis que passariam a acompanhar os preços internacionais, "o mais provável é que o governo implemente uma regra com mais transparência sobre a forma como os preços dos combustíveis são reajustados, mas ainda conceda uma margem de manobra ao governo na implementação".
Já o analista de um grande banco acha que a situação ficou tão ruim que agora não existem mais paliativos. "Existe um problema sério na Petrobras que, de certa forma, eles se dispuseram a resolver. E agora se vier um modelo ruim, que não resolve, só resta rezar para o câmbio, e o preço do petróleo até que o dinheiro da Petrobras acabe", ironiza.
Contudo, mesmo se implementada a nova regra, os analistas da Eurasia consideram "improvável" que a diretoria da Petrobras consiga autorização para reajustar combustíveis sem a necessidade de chancela prévia do conselho de administração. Na avaliação da consultoria, o governo está mais sensível às necessidades da empresa devido às crescentes restrições operacionais e financeiras e à melhora da posição de Dilma nas pesquisas de intenção de votos para as eleições de 2014, o que segundo eles tornam mais fácil para a presidente "aceitar o golpe político que vem com preços domésticos dos combustíveis mais altos".