Aumenta a concorrência entre portos do Sul

A competição entre os portos brasileiros, que o governo federal quer incentivar mudando a legislação do setor, já é algo percebido entre os complexos de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, e isso é motivado pelo próprio mercado. A tendência é de que essa concorrência fique cada vez mais intensa. Quem agradece são as indústrias e os produtores agrícolas, pois portos mais eficientes significam um comércio melhor.
 
Uma das vantagens competitivas entre os sistemas portuários dos dois estados é que enquanto os gaúchos concentram as operações em Rio Grande, Santa Catarina apresenta um número maior de opções através de estruturas menores. Conforme dados da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), no ano passado o porto do Rio Grande movimentou cerca de 17 milhões de toneladas em cargas, e Imbituba, Itajaí e São Francisco do Sul somaram aproximadamente 16,9 milhões de toneladas. A diferença vem caindo com o passar dos anos. Em 2008, os números eram, respectivamente, 15,1 milhões de toneladas contra 13,9 milhões de toneladas.
 
Quanto a contêineres, Rio Grande operou em 2012 cerca de 611 mil TEUs (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés), e os outros três portos catarinenses, juntos, em torno de 521 mil TEUs. Porém, Santa Catarina movimenta muito mais contêineres do que o Rio Grande do Sul se forem somados também os resultados dos terminais de Itapoá (270 mil TEUs) e Portonave (618 mil TEUs), esse último localizado em Navegantes.
 
A capacidade de transporte de cargas em Santa Catarina aumentará ainda mais nos próximos anos. Na semana passada, a Secretaria de Portos (SEP) autorizou a construção de mais um empreendimento naquela região: o Terminal de Granéis de Santa Catarina (TGSC). O projeto, que será desenvolvido em São Francisco do Sul, foi concebido em 2007 em parceria entre a Logz Logística Brasil e a Sagah Administração e Participações. O complexo deverá movimentar em torno de 4,5 milhões de toneladas ao ano. O foco será a exportação de granéis vegetais como soja e farelo, e o investimento na iniciativa será de cerca de R$ 316 milhões.
 
O presidente da Câmara de Transporte e Logística da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc), Mario Cezar de Aguiar, salienta que os portos catarinenses estão crescendo e têm como virtude serem dinâmicos. O dirigente ressalta que os complexos daquela região movimentam aproximadamente 17% dos contêineres no Brasil, ficando atrás apenas de São Paulo. Quanto ao transporte de grãos, a estrutura que tem essa vocação é a de São Francisco do Sul.
 
“Santa Catarina tem uma condição invejável no País”, diz Aguiar. Porém, antes de defender um porto ou outro, o representante da Fiesc afirma que é preciso proteger a competitividade do produto nacional. O dirigente calcula que o custo logístico do Brasil é, no mínimo, 50% superior ao dos Estados Unidos. Conforme Aguiar, os portos catarinenses têm recebido constantes investimentos e possuem boas condições de infraestrutura, calado e bacia de evolução. Os maiores obstáculos estão na chegada e na saída dos portos. Ou seja, os modais rodoviário e ferroviário precisam de recursos.
 
Para o vice-presidente da Federação do Comércio de Bens e de Serviços do Estado do Rio Grande do Sul (Fecomércio-RS), Arno Gleisner, o porto do Rio Grande tem uma qualidade, neste momento, superior ao dos vizinhos catarinenses. O dirigente atribui isso às instalações do complexo, aos sistemas de procedimentos e, particularmente, ao terminal de contêineres gaúcho (Tecon Rio Grande). Entretanto, o dirigente admite que as taxas aplicadas em Rio Grande são mais elevadas do que as de Imbituba e Itajaí, por exemplo. Além disso, a distância rodoviária e os vários pedágios que precisam ser pagos até chegar a Rio Grande são outras dificuldades.
 
Gleisner acredita que todas as empresas do Norte do Rio Grande do Sul, independentemente do segmento, em algum momento consideraram a possibilidade de utilizar os portos catarinenses. Segundo o vice-presidente da Fecomércio-RS, a decisão quanto à escolha do porto é tomada pelos empresários dependendo das oportunidades. As companhias tendem a fugir de “congestionamentos”. O dirigente recorda que Santa Catarina, durante muito tempo, até o final do ano passado, concedeu benefícios aos importadores. A medida atraiu muitas empresas gaúchas, que instalaram unidades no estado vizinho ou utilizaram a operação de desembaraço lá. Contudo, Gleisner informa que a resolução 13 do Senado (unificação da alíquota do ICMS na importação em 4%) e posteriores atos do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) acabaram diminuindo essas vantagens. A iniciativa ficou conhecida como fim da “guerra dos portos”.
 
 
Complexos estimam crescimento na movimentação de cargas neste ano
 
Rio Grande e São Francisco do Sul, o porto catarinense que movimenta o maior volume de cargas naquele estado, esperam aumentar o transporte de mercadorias neste ano. O superintendente do Porto do Rio Grande, Dirceu Lopes, explica que há divergências entre os números da Antaq e os da Superintendência do Porto do Rio Grande (Suprg), pois a agência só leva em conta a movimentação do Porto Novo e de alguns empreendimentos arrendados e não os Terminais de Uso Privado (TUPs). Terminais como o da Bianchini, por exemplo, não entram no cálculo. Mas, de qualquer forma, nos dois métodos a expectativa é de crescimento.
 
Se forem levadas em conta as bases da Antaq, Lopes calcula uma movimentação de 19 milhões de toneladas neste ano e, se for pela versão da Superintendência, a movimentação será de 30 milhões de toneladas (contra 27 milhões de toneladas em 2012). Lopes comenta que cada porto tem a sua particularidade. “E o governo federal vem investindo em todos para melhorar as operações”, afirma o superintendente. Para o dirigente, a competição é salutar e cabe aos gestores regionais aprimorarem a qualidade do serviço para atrair os clientes. No caso do Rio Grande, Lopes cita a agilidade operacional como um fator de fidelização dos usuários.
 
O presidente do Porto de São Francisco do Sul, Paulo César Corsi, destaca que o complexo catarinense é de múltiplo uso e bastante produtivo, operando com grãos para exportação, carga geral e contêineres. Entre os principais produtos agrícolas movimentados estão soja, farelo e milho. Esses itens são provenientes, principalmente, de Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso. O dirigente estima para este ano uma movimentação de cerca de 12 milhões de toneladas (contra 10,9 milhões de toneladas em 2012).
 
Corsi concorda que a maior dificuldade enfrentada pelos portos brasileiros hoje são os acessos rodoviário e ferroviário. Quanto ao novo terminal que deve ser construído no município, o TGSC, Corsi antecipa que será um terminal que nascerá para atender a uma demanda já reprimida. “Será algo importante que aumentará a movimentação na região”, avalia o
dirigente.
 
 
Disputa chega aos terminais de contêineres
 
A concorrência entre os portos catarinenses e o do Rio Grande também abrange os terminais de contêineres. Nessa área, apesar do complexo de Imbituba registrar uma pequena movimentação de contêineres atualmente, 21 mil TEUs em 2012, é o complexo que, pela proximidade e pela duplicação da BR-101, pode atrair muitas cargas provenientes do Rio Grande do Sul.
 
O coordenador da comissão de infraestrutura do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas e Logística no Estado do Rio Grande do Sul (Setcergs) e diretor-presidente da Navegação Taquara, Frank Woodhead, pondera que Imbituba ainda não decolou por razões comerciais das companhias de navegação. “Uma empresa de navegação nunca gosta de abrir a rota para mais um porto, se já está indo para Itajaí, por que ir para Imbituba?”, indaga o dirigente. Porém, o empresário crê que a Santos Brasil, que administra o terminal de contêineres desse município, encontrará uma solução. “O dia em que isso ocorrer, abrirá uma enorme concorrência para o porto do Rio Grande”, projeta. Woodhead justifica essa previsão explicando que as cargas da Serra gaúcha serão colocadas em caminhões, seguirão pela Rota do Sol, entrarão na BR-101 e alcançarão com facilidade Imbituba sem sofrer com pedágios. “Os pedágios são um problema (no Rio Grande do Sul), estão encarecendo muito o porto de Rio Grande”, lamenta o empresário.
 
Woodhead diz que hoje há mais opções em Santa Catarina e com isso se cria mais concorrência. Outra dificuldade enfrentada em Rio Grande é que o porto, muitas vezes, é “fechado” devido às más condições climáticas e de navegação. “Os navios ficam esperando algumas horas lá fora (sem atravessar os molhes da barra e entrar na Lagoa dos Patos), se não tem perspectiva de abrir, as embarcações vão para Santa Catarina”, afirma o dirigente.
 
“Temos Imbituba sempre na linha de acompanhamento, porque (o terminal) nunca focou cargas catarinenses e sim do Norte do Rio Grande do Sul”, revela o presidente do Tecon Rio Grande, Paulo Bertinetti. No entanto, o executivo não teme a competição e acrescenta que o Tecon já tem uma operação estabelecida. O empresário enfatiza ainda que a companhia possui escritórios em Caxias do Sul e Porto Alegre para “ficar mais próxima dos seus clientes”. Bertinetti acredita que é mais provável Imbituba “roubar” cargas de Itajaí do que do Rio Grande.
 
“Competição sempre vai existir, todos os portos vão tentar tirar cargas de outros”, sustenta o presidente do Tecon Rio Grande. O executivo afirma que a concorrência é inclusive internacional, com portos como o de Montevidéu. Estrutura para enfrentar essa disputa o Tecon Rio Grande possui. O complexo tem capacidade para movimentar 1,25 milhão de TEUs ao ano, com 15 metros de calado e 900 de berço. Bertinetti adianta que a meta é ampliar mais esse cais, alcançando 1,2 mil metros. Essa expansão deverá ser concluída em 2015.
 
O executivo salienta que a SEP deverá instalar no porto do Rio Grande um sistema de monitoramento de entrada e saída de navios (VTMIS). A ferramenta possibilitará o acompanhamento das manobras e das condições de vento e de navegação. “Então haverá uma gestão técnica e não subjetiva”, comemora Bertinetti. Também deverão ser implementadas dentro do canal do porto cinco áreas de fundeio especiais. “É como se fizesse um carrossel de navios”, compara o presidente do Tecon. Enquanto uma embarcação estiver atracada, as outras poderão ocupar as áreas de fundeio. Com isso, os navios não precisarão esperar fora da Lagoa dos Patos e ficar sujeitos a não carregarem ou descarregarem devido às condições climáticas. Quanto a Santa Catarina, as atenções estão voltadas ao projeto da ferrovia Litorânea, que interligará os portos catarinenses e possibilitará um novo caminho até São Paulo.