Proposta para caminhões desagrada indústria e atrasa regime automotivo

A reação negativa da indústria à última proposta do governo para medir o conteúdo de peças nacionais em caminhões criou novo impasse na finalização do regime automotivo. Os representantes das montadoras decidiram reunir-se, hoje, em busca de uma contraproposta para reverter os índices apresentados pelo governo. Apesar da pendência, também hoje, técnicos dos ministérios da Fazenda, do Desenvolvimento e da Ciência e Tecnologia se reúnem para dar os últimos retoques no elenco de medidas. A equipe econômica espera que a publicação do decreto junto com a sanção da presidente Dilma Rousseff à MP 563 ocorra amanhã ou, no máximo, até segunda-feira.
 
A nova polêmica em torno, agora, dos caminhões, surgiu quando o governo decidiu fixar uma exigência inicial de conteúdo nacional para caminhões maior que a estabelecida para automóveis. A diferença é consequência da fórmula que foi criada para dar às empresas mais novatas tempo de adaptação às novas regras de nacionalização de autopeças.
 
O novo regime estabelece uma alíquota adicional de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de 30 pontos percentuais nos veículos que não atingirem 60% de conteúdo nacional. Mas, como várias empresas ainda dependem da importação foi criado um índice multiplicador, de 1,3 nas compras de componentes automotivos de cada empresa. O valor das compras de componentes, ampliado pelo multiplicador, pode ser descontado do IPI devido, o que permitirá às empresas abater até 100% dos 30 pontos percentuais adicionais do IPI. Esse multiplicador será gradativamente reduzido até 2017.
 
O multiplicador agradou os fabricantes de automóveis. Com esse adicional equivalente a 30%, as empresas ganharão uma proteção temporária enquanto aceleram os projetos de nacionalização doa carros. "Sem isso não poderíamos produzir no Brasil", diz o gerente geral de relações públicas e governamentais da Toyota, Ricardo Bastos. A Toyota acaba de inaugurar uma nova fábrica para produzir seu primeiro carro compacto no Brasil. É para esses novos investimentos que a proteção do regime automotivo está voltada.
 
Se para a montadora que ainda depende da importação o multiplicador representa um fôlego, para a que já tem índice de nacionalização elevado, a fórmula acaba por gerir um crédito que poderia, aos olhos da equipe econômica, estimular mais importação. É o caso do segmento de caminhões, que há anos opera com alto índice de conteúdo local, porque a nacionalização acima de 65% é condição para acesso ao Finame, linha do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) com taxas mais baixas para financiamento de caminhões, ônibus e máquinas.
 
Para evitar que a indústria usasse esse crédito para importar mais, o governo decidiu manter o multiplicador de 1,3 apenas para os automóveis, comerciais leves e caminhões pesados (com capacidade acima de 45 toneladas). A explicação, confirmada pelas empresas, é que os caminhões da linha pesada dependem mais de produtos importados, como itens para sistemas de transmissão.
 
Para os caminhões médios e leves, a equipe econômica estabeleceu o contrário. Criou um redutor, o que provocou os protestos da indústria. "Não é justo que para ajudar quem começa a investir agora no país sejam criadas regras que prejudiquem as empresas que há tempos se esforçam para nacionalizar seus produtos", afirma fonte da indústria
 
Já foi acertado que o multiplicador – ou redutor – será calculado por empresa, o que permitirá flexibilidade para complementar linhas. Ou seja, ao poder fazer o cálculo sobre o total das compras, a empresa poderá compensar a importação de componentes para produção de determinados veículos, principalmente os mais sofisticados, nos maiores volumes de compras de peças nacionais, utilizadas principalmente nos modelos mais simples. A indústria espera que a regra permita fazer a compensação para a importação de carros completos. O governo também está preocupado com empresas que produzem caminhões e automóveis.
 
A indústria de autopeças também aguarda mais informações sobre as regras. O presidente do Sindicato da Indústria de Autopeças (Sindipeças), Paulo Butori, diz estar preocupado com o aumento das importações. Segundo ele, este ano, a balança comercial do setor deverá apresentar um déficit de R$ 6,5 bilhões. No ano passado o resultado, também negativo, foi de R$ 4,5 bilhões.
 
"Se as montadoras vão ter proteção, as empresas que produzem as peças também precisam", destaca o dirigente. Segundo ele, a maior parte das compras externas é feita pelos fabricantes de veículos. Mas os fornecedores que fazem os conjuntos de componentes dos automóveis, como painéis, por exemplo, também importam componentes. É como ter esse tipo de controle, de toda a cadeia produtiva do setor, que hoje mais preocupa o governo.