Projeto que altera a Lei de Falências segue para sanção presidencial

O Plenário do Senado aprovou em votação simbólica nesta quarta-feira (25) projeto que amplia o financiamento a empresas em recuperação judicial, permite o parcelamento e o desconto para pagamento de dívidas tributárias e possibilita aos credores apresentar plano de recuperação da empresa, entre outras medidas. O PL 4.458/2020 teve parecer favorável do senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), com emendas de redação, e segue agora para sanção do presidente da República. A sessão remota foi presidida pelo senador Antonio Anastasia (PSD-MG).

No Senado, das 65 emendas apresentadas, seis foram retiradas pelos autores. O relator acolheu três emendas, todas com mudanças redacionais: uma do senador Eduardo Gomes (MDB-TO) e duas da senadora Rose de Freitas (Podemos-ES). Rodrigo Pacheco também incluiu 13 emendas redacionais de sua autoria.

A proposta modifica diversos pontos da Lei 11.101, de 2005, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência empresarial, e da Lei 10.522, de 2002, que dispõe sobre o cadastro informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais. Também há mudanças na Lei 8.929, de 1994, que institui a Cédula de Produto Rural e dá outras providências.

Na recuperação extrajudicial, devedores e credores tentam entrar em um acordo, sem que seja preciso a intervenção da Justiça. Já a recuperação judicial conta com a intervenção da Justiça para negociar uma alternativa para a empresa em dificuldades continuar a funcionar. Assim, a recuperação judicial serve para tentar evitar a falência. Na falência, a empresa encerra suas atividades e todos os seus ativos — equipamentos, maquinários, edifícios, entre outros — são recolhidos pela Justiça e vendidos para o pagamento das dívidas.

Financiamento de risco

O projeto também regulamenta empréstimo para devedor em fase de recuperação judicial. Esse tipo de empréstimo, conhecido como dip financing (debtor in possession financing), implica muitos riscos para o financiador, e por isso poucos bancos aceitam fazê-lo.

Conforme o texto aprovado, se autorizado pelo juiz, o devedor em recuperação judicial poderá fazer contratos de financiamento para tentar salvar a empresa da falência. Se a falência for decretada antes da liberação de todo o dinheiro do financiamento, o contrato será rescindido sem multas ou encargos. Esse financiamento poderá ser garantido com bens da empresa, como maquinários e prédios, por meio de alienação fiduciária ou mesmo na forma de garantia secundária. Se houver sobra de dinheiro na venda do bem, ela será usada para pagar o financiador.

O texto altera a ordem de pagamento dos credores, dando preferência para os créditos derivados de dip financing.

Dívidas tributárias

Outra mudança é a ampliação das possibilidades de parcelamento de dívidas com a União para a empresa em recuperação judicial.

O texto aumenta o número de prestações de 84 para 120 e diminui o valor de cada uma. A empresa também poderá quitar até 30% da dívida consolidada e dividir o restante em até 84 parcelas. Para pagar essa entrada, será possível usar 25% do prejuízo fiscal e 9%, 17% ou 25%, conforme o tipo de empresa, da base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

Como condições para aderir ao parcelamento, o devedor assinará termo de compromisso pelo qual fornecerá ao Fisco informações bancárias e de comprometimento de valores a receber, além de direcionar ao pagamento da dívida até 30% do produto da venda de bens realizada durante o período de vigência da recuperação judicial.

Caso a empresa deixe de pagar parcelas, se for constatado esvaziamento patrimonial para fraudar o parcelamento ou as condições sejam descumpridas, o parcelamento será cancelado e o débito total exigido.

Também será possível dividir em até 24 meses débitos atualmente proibidos de serem parcelados, como os relativos a tributos com retenção na fonte ou de terceiros (imposto de renda do empregado, por exemplo) e o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).

Transação tributária

O projeto aprovado também prevê o uso de transação tributária, que são acordos para pagamento de dívidas mediante concessão de benefícios. A transação tributária foi regulamentada pela Lei 13.988, aprovada pelo Congresso em abril. Nessa modalidade, o governo ou o devedor propõe descontos para quitar a dívida, que podem chegar a 70% do valor devido, a ser paga em prazo máximo de 120 meses.

No caso de micro e pequenas empresas, o prazo pode chegar a 144 meses. Se a empresa desenvolve projetos sociais, o prazo pode ser aumentado em mais 12 meses.

Segundo o projeto, devedores em recuperação judicial que já tiverem firmado acordos desse tipo poderão pedir a repactuação. O prazo para o pedido será de 60 dias da publicação da futura lei.

Plano de recuperação

A possibilidade de que os credores apresentem um plano de recuperação da empresa é outra novidade do PL 4.458/2020. Para Rodrigo Pacheco, essa solução é correta. Prevista no direito norte-americano, segundo o relator, é uma medida que ajuda a resolver o impasse na negociação entre credores e devedor acerca do plano de recuperação judicial ao autorizar os credores a apresentarem e aprovarem plano próprio, mesmo contra a vontade do devedor.

Conforme o projeto, na hipótese de o plano de recuperação judicial do devedor ser rejeitado, a assembleia poderá aprovar prazo de 30 dias para a apresentação, pelos credores, de um plano de recuperação da empresa.

Esse plano deverá cumprir algumas condições, como o apoio de credores que representem mais de 25% dos débitos ou de credores presentes na assembleia que representem mais de 35% dos créditos. Não poderá ainda haver imposição, aos sócios do devedor, de sacrifício de seu capital maior do que viria da falência.

O texto que vai à sanção do presidente da República também condiciona a decretação da falência à rejeição do plano de recuperação dos credores ou a sua não apresentação. A falência será decretada ainda se o devedor descumprir o parcelamento de dívidas tributárias prevista no projeto ou se for identificado esvaziamento patrimonial da empresa que implique prejuízo dos credores.

Suspensão de ações

A legislação atualmente em vigor regula o stay period (período de suspensão de ações contra a empresa em processo de recuperação judicial), marcando o início com o despacho da decisão judicial que recebe o pedido de recuperação e o término em 180 dias após essa data, com suspensão de ações e execuções no período, salvo as de natureza fiscal e as derivadas de contratos de leasing ou propriedade fiduciária.

O PL 4.458/2020 mantém essa regra, mas permite que o prazo de 180 dias seja prorrogado por duas vezes, a primeira a critério do juiz e a segunda a critério dos credores. A mudança almeja dar mais previsibilidade aos credores da regra de prorrogação do stay period, com critérios fixados em lei.

O projeto permite ainda que o juiz da recuperação interfira, por cooperação jurisdicional, na constrição de bens em sede de execução fiscal ou de reintegração de posse em leasing ou, ainda, em ação de busca e apreensão em propriedade fiduciária, sempre que os bens sob constrição sejam essenciais ao negócio do devedor empresário. Determina, ainda, a observância das convenções de arbitragem, mesmo se a empresa estiver em recuperação, bem como suspende as execuções trabalhistas contra responsável subsidiário até o encerramento da recuperação judicial.

Conciliação e mediação

O texto aprovado reforça o uso da conciliação e da mediação no processo de recuperação e falência, com a criação de um mecanismo de suspensão de execuções contra o devedor, por 60 dias, a fim de incentivar a negociação com os credores.

Também serão admitidas conciliações e mediações em disputas entre sócios da empresa ou em conflitos envolvendo concessionárias ou permissionárias de serviços públicos em recuperação judicial e os órgãos reguladores ou entes públicos municipais, distritais, estaduais ou federais.

Em períodos de calamidade pública, como no caso da covid-19, o texto permite conciliação e mediação para garantir a prestação de serviços essenciais se relativa a créditos que não entrarão na disputa com os demais credores, os créditos extraconcursais.

Proteção do adquirente de bens

Atualmente, a legislação exime quem adquire bens de uma empresa em recuperação judicial de assumir dívidas vinculadas ao processo. O projeto amplia a blindagem do adquirente ainda mais, explicitando que ele não assumirá dívida de qualquer natureza, seja ela ambiental, regulatória, administrativa, tributária, penal, trabalhista ou derivada de normas anticorrupção. Para o relator, a medida é saudável, pois incentiva a aquisição dos ativos que pode ajudar a gerar o capital necessário à reestruturação da empresa.

Créditos trabalhistas

Ao contrário da proibição atual de incluir créditos trabalhistas ou por acidente de trabalho na recuperação extrajudicial, o projeto permite sua inclusão se houver negociação coletiva com o sindicato da respectiva categoria profissional.

O texto também modifica o prazo para pagamento de crédito trabalhista por empresa em recuperação judicial. Atualmente, a lei prevê o pagamento dos créditos trabalhistas em até um ano a contar da homologação do plano de recuperação judicial.

Pelo projeto, o devedor terá até dois anos para fazer o pagamento desse tipo de crédito. Esse prazo, no entanto, deverá ser aprovado pelos próprios credores trabalhistas na votação do plano.

Distribuição de lucros

O PL 4.458/2020 insere na Lei de Falências a proibição de distribuição de lucros e dividendos durante o processo de recuperação judicial. Com isso, o projeto visa garantir que a reserva de lucros seja utilizada para honrar o compromisso do devedor com seus credores ou capitalizar a empresa em recuperação judicial.

Meios de recuperação judicial

A ampliação dos meios de recuperação judicial é outra medida do projeto. Hoje a Lei de Falências já prevê 16 meios de recuperação judicial, entre eles a concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas e a alteração do controle societário.

O texto insere nessa lista a conversão da dívida em capital social e a venda integral da empresa.

Homologação de credores

Atualmente, a lei só permite o encerramento da recuperação judicial após a homologação do quadro geral de credores, o que é demorado e atrasa o processo. Por isso, o projeto permite o encerramento da recuperação judicial antes da homologação desse quadro geral.

Os credores que não forem reconhecidos antes do encerramento terão suas ações redistribuídas ao juízo da recuperação judicial como ações autônomas e observarão o rito comum.

Deliberação virtual

Hoje, a legislação trata da assembleia geral de credores como ato presencial. No entanto, pelo projeto, qualquer deliberação da assembleia geral poderá ser substituída, com idênticos efeitos, por termo de adesão firmado por credores de acordo com o quórum de aprovação específico, por votação em sistema eletrônico que reproduza as condições de tomada de voto da assembleia geral de credores ou por outro mecanismo considerado seguro pelo juiz.

Impostos

O projeto dispensa o devedor de pagar imposto de renda e CSLL em caso de ganho de capital derivado de venda de bens em recuperação ou falência, salvo se o adquirente for empresa do mesmo grupo econômico.

Fonte: Agência Senado