Tabelar preço de frete pode gerar formação de cartel, diz Cade

Parecer do conselho enviado ao STF afirma que tabelar preço traz prejuízos à sociedade e à livre concorrência no setor. Criação da tabela é parte de acordo entre governo e caminhoneiros.

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) afirmou que o tabelamento do preço do frete traz prejuízos à sociedade e cria uma espécie de cartel no setor. A avaliação está em parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF).

A criação de uma tabela de preço mínimo do frete foi uma das condições negociadas pelo governo com representantes dos caminhoneiros para encerrar a greve da categoria.

Durante 11 dias, no fim de maio, caminhoneiros bloquearam várias estradas brasileiras, prejudicando o abastecimento de comida, combustíveis, entre outros itens.

O parecer responde ao pedido de manifestação do ministro Luiz Fux, que é relator de ações que questionam o tabelamento no STF.

O Cade aponta no documento que o tabelamento de preços mínimos pode gerar resultado semelhante ao de formação de cartel, prejudicando a concorrência no mercado.

“[…] tabelamento de preços mínimos acaba gerando, ao final, o resultado semelhante ao de uma cartelização, ou seja, a uniformização dos preços de agentes que deveriam concorrer no mercado por meio da oferta de melhores serviços”, aponta o documento.

No texto, o Cade lembra que o tabelamento de preço é uma infração econômica que já foi punida pelo próprio órgão de defesa da concorrência e cita como exemplo a condenação de tabela de preços de serviços médicos, de transporte de combustíveis e de agências de viagens.

Prejuízos para o consumidor
Ainda de acordo com o documento do Cade, o consumidor final acabará pagando pelo aumento de preço decorrente da medida.

“No presente caso, a posição desta entidade é que o tabelamento, com o estabelecimento de preços mínimos, não apresenta benefícios ao adequado funcionamento do mercado e ao consumidor final, que arcará com os aumentos de preço decorrentes de tal medida”, afirmou o Cade no documento.

A criação da tabela de frete mínimo foi autorizada por medida provisória, publicada pelo governo federal.

Riscos para o mercado
Segundo o Cade, o estabelecimento de um preço fixo também coloca em risco os incentivos à inovação de mercado e tende a desestimular os competidores a desenvolverem serviços mais eficientes.

O tabelamento também pode levar a queda de qualidade do serviço e criar um desvio de demanda.

“Geram no horizonte de longo prazo o risco de enfraquecimento do próprio mercado relevante daquele produto/serviço pela perda de interesse dos consumidores em dele se utilizar”, disse o Cade.

O documento levantou ainda o risco que o tabelamento representa para os próprios caminhoneiros.

“Seja porque se aumenta o risco de o cliente decidir internalizar o serviço de frete, a depender dos custos mínimos impostos via tabela, seja porque se cria a possibilidade de, em um cenário com excesso de oferta, parte dos caminhoneiros decidir, por sua própria vontade, não seguir a tabela, criando distorções de competitividade dentro da própria classe de transportadores, em que os cumpridores da norma irão perder competitividade”, disse o Cade.

Contraponto
Já a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) defende a validade da medida provisória que tabelou o preço mínimo do frete.

A agência também se manifestou em parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal, na mesma ação que discute o tabelamento do preço do transporte de cargas.

O argumento é o mesmo que a Presidência da República utilizou: que o princípio do livre mercado não é absoluto e que é preciso priorizar a dignidade da pessoa humana – ou seja, é mais importante assegurar que o caminhoneiro terá os custos cobertos.

Segundo a ANTT, a intervenção do estado, como ocorreu que o tabelamento, é permitida para atender os interesses coletivos.

“Ao se fixar o mínimo se está garantindo uma política de preços de mercado que não sejam subestimados, como vinha ocorrendo até então. (…) Intervenção do estado no domínio econômico será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou diante da presença do relegante interesse coletivo”, diz o documento.

Para a agência, caso a medida seja suspensa, o “caos” voltará ao país. “Conceder a tutela pleiteada neste momento, seja para suspender a eficácia da MP ou da resolução da ANTT (…) lançará o país no mesmo caos em que se encontrava dias atrás”, argumentou a agência.

Acordo pelo fim da greve
A tabela com preços mínimos para os fretes foi estabelecida em resolução da ANTT depois de publicada medida provisória que estabeleceu a política de preços mínimos para o transporte de cargas

A tabela, porém, foi criticada, especialmente pelo setor de agronegócio, que afirmou que a medida feria a livre concorrência. O ministro da Agricultura, Blairo Maggi, chegou a dizer que, em alguns casos, a tabela dobrou o valor do frete.

Com a repercussão negativa, a ANTT divulgou na semana seguinte uma segunda tabela, distribuindo os preços para todo tipo de caminhão, quantidade de eixos e o valor do quilômetro por eixo.

No entanto, horas depois, a agência informou que revogaria a tabela após a reação de caminhoneiros, que discordaram dos valores. Foi aberta, então, uma nova rodada de negociações para elaborar uma terceira tabela, mas ainda não há consenso. Na prática, a primeira tabela é a que está valendo no momento.

A medida provisória que instituiu preços mínimos para os fretes é alvo de ações no STF. O relator do caso, ministro Luiz Fux, deu um prazo de 48 horas para órgãos do governo federal se manifestarem sobre medida provisória.

Fonte: G1, Brasilia