Restrições viárias afetam os custos das distribuidoras

Abastecer São Paulo e a Grande São Paulo, um dos maiores conglomerados urbanos do mundo, exige planejamento, tecnologia e muito investimento. As frotas responsáveis pela distribuição de produtos esbarram em obstáculos como ruas congestionadas e proibição da circulação de caminhões em determinados horários e regiões. Ainda não se sabe o volume e os percursos que envolvem essa gigantesca operação – somente agora a prefeitura paulistana está realizando um estudo sobre origem e destino de cargas na cidade.


Os caixas das empresas e o bolso dos consumidores, contudo, já arcam com esses custos: estima-se que os gastos com logística foram impactados em até 50% por causa da falta de estrutura e novas regras na distribuição. As empresas responderam mudando suas frotas para caminhões menores e investindo em rastreadores inteligentes que indicam a rota mais adequada. Os custos aumentaram entre 30% e 50% e foram repassados para os produtos, pesando no bolso do consumidor , afirma Ramon Alcaraz, presidente da Fadel Transporte e Logística Ltda. A companhia já incorporou a alta aos preços de forma integral.

 

A Fadel é responsável pela distribuição de todos os produtos da Ambev, o que significa chegar a todos os pontos de comércio, do centro aos extremos da cidade. Segundo Alcaraz, que também é conselheiro da Associação Brasileira de Logística (Abralog), a política de restrições de tráfego nos centros urbanos levou a companhia a trocar sua frota, que na época contava com 100 caminhões pesados. Cada caminhão de grande porte foi substituído por dois menores, o que demandou mais mão de obra e ampliou custos fixos e variáveis na distribuição. São sete mil entregas diárias apenas na capital paulista , informa. Isso não aconteceu só com a minha companhia, mas no mercado todo , acrescenta.

 

Com a entrega no varejo bem encaminhada, o desafio passou a ser o abastecimento dos Centros de Distribuição. A solução, para muitas empresas, tem sido a implantação de CDs ao longo do Rodoanel e nas cidades próximas, utilizando carretas em horários noturnos e evitando entradas e saídas desnecessárias na malha da capital. Nesse caso fazemos as entregas entre 22 horas e 6 horas, o que encarece os custos , diz o presidente da Fadel Transporte.

 

João Oneda, diretor de logística do mercado interno da BRF – dona das marcas Sadia, Perdigão, Batavo, Elegê e Qualy – observa que a Lei do Silêncio, a partir das 22 horas, e a restrição na circulação foram dois pontos que tiveram que ser conciliados na área de distribuição. A exemplo da Fadel, a BRF substituiu a frota de caminhões com capacidade entre 3,5 e 6,5 toneladas pelos de menor porte e criou pontos de transbordo . Com centros de armazenagem no Embu – Região Metropolitana de São Paulo – e Jundiaí, a 60 quilômetros da capital, a empresa gasta cerca de duas horas para fazer a primeira entrega diária de mercadorias para sua clientela.

 

Criamos o travelling salesman problem (TSP) , diz Oneda. Sair do CD e chegar a outro extremo da cidade, atravessando o centro, seria impossível. A solução foi sair com uma única carreta por volta das 22 horas, posicioná-la dentro do TSP, e fazer o transbordo para os caminhões pequenos, com a carreta retornando dentro do horário permitido , detalha.

 

Hoje os produtos da BRF são entregues em 12 pontos da capital com cerca de cem carretas, todos os dias, que funcionam como centros de distribuição. Nossa frota em São Paulo está perto de mil caminhões e 130 carretas, que fazem os transbordos. É como se tivesse um CD ambulante , compara.

 

A reposição dos estoques no varejo exige que as operações se iniciem de madrugada. É uma forma de acessar os clientes bem cedo para repor os estoques nas cozinhas industriais e padarias, que somam 40 mil clientes na capital, o que significa três mil toneladas/dia , diz o diretor da BRF. Oneda prefere não divulgar quanto as mudanças impactaram no preço final do produto. O mercado estima entre 20% e 35%. Tivemos uma forte pressão de custos, que já foram diluídos no preço dos produtos.

 

Markenson Marques, presidente da Cargolift, responsável pela logística de montadoras automobilísticas, transporta diariamente 9,6 mil toneladas na Grande São Paulo. Para evitar dor de cabeça, investiu US$ 230 mil nos últimos dois anos e equipou sua frota com rastreadores inteligentes que apontam, em tempo real, a melhor rota a ser percorrida. Toda frota da Cargolift está interligada pelo sistema. São 526 caminhões de pequeno, médio e grande portes , afirma. Os pesados representam 70% da frota. Além do planejamento estratégico, tivemos a preocupação de criar os terminais nos quais os caminhões carregam e descarregam próximos ao Rodoanel de São Paulo , diz.

 

A companhia faz 25 mil operações por mês. Cerca de 45% do volume das cargas tem como destino as unidades de São Paulo.

 

Para Edson Carillo, vice-presidente de marketing da Abralog e diretor da Connexxion Brasil, especializada em logística e cadeia de abastecimento, os altos custos ocasionados pela mudança no trânsito estão corroendo as margens das transportadoras. Estima-se que o frete tenha sofrido um impacto de 20% e alguns transportadores não conseguiram repassar nem metade desses custos , calcula. Especialista em projetos de logística, a Connexxion desenvolveu cinco projetos nos últimos dois anos destinados aos varejistas.

 

Empresas da área de vestuário, artigos esportivos e uma drogaria, todas de grande porte, já procuraram a Connexxion em busca de solução para o problema. Esses empresários decidiram se mudar para a região do Rodoanel exclusivamente para fazer o abastecimento da cidade. Os desenhos têm evitado o uso das áreas centrais, fazendo uma movimentação externa. A tendência tem sido a de entrar com a carga para abastecer a cidade, e não ter a cidade como um polo para abastecer a si mesma e outras regiões , explica. Antes, as operações eram em São Paulo onde abasteciam lojas da capital e cidades fora capital , o que é impossível hoje, tanto pelas restrições legais como pelos engarrafamentos.

 

Hoje, nenhum órgão dispõe de estatísticas sobre o volume de carga movimentada na cidade e as características dessa movimentação. A Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), da Prefeitura de São Paulo, no entanto, informa que em breve, terá os primeiros dados sobre a Pesquisa Origem/Destino de Cargas de São Paulo.