Portos perdem investimentos e competitividade

Tão sucateado como as rodovias, o setor portuário brasileiro vai exigir do governo federal um pacote bem mais elaborado para ampliar a infraestrutura atual e melhorar a qualidade dos serviços. Nos últimos anos, apesar do ciclo de expansão verificado entre 2006 e 2009, a participação dos portos caiu em relação ao total de investimentos de transportes. Em 2002, representava 19,2% e, no ano passado, encolheu para 9,5%.
 
De acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o pico de investimentos ocorreu em 2009, quando foram injetados R$ 3,39 bilhões. De lá para cá, no entanto, o movimento inverteu o sentido e os recursos minguaram. Nos últimos dois anos, houve queda de 35% no total de dinheiro aplicado no setor. Os investimentos públicos recuaram de R$ 2,18 bilhões para R$ 730 milhões. Já os privados mantiveram-se estáveis, embora sejam fruto de projetos desenhados no passado.
 
A apatia dos negócios foi traduzida na piora da competitividade do País. Em 2011, a qualidade dos portos brasileiros recuou sete posições no ranking do Fórum Econômico Mundial e ficou entre os 13 piores sistemas do mundo (num total de 142 países). Os investimentos que estão sendo feitos no setor apenas estão mantendo a infraestrutura atual e não estão acompanhando o avanço da economia e do comércio exterior. "Para os empresários, o maior gargalo da porta da fábrica para fora está nos portos", diz o diretor do Ipea, Carlos Alvares da Silva Campos Neto.
 
O primeiro passo para reverter a situação é a redução dos riscos regulatórios. Nas últimas décadas, o setor passou por inúmeras transformações e diferentes regras. Um exemplo é o Decreto n.º 6.620, de 2008, que regulamenta a concessão, autorização e arrendamento de terminais. Até então, qualquer investidor tinha sinal verde para erguer um novo terminal em qualquer local da costa brasileira.
 
A medida, no entanto, incomodou os arrendatários de terminais de contêineres instalados dentro dos portos públicos. Eles reclamavam que os novos terminais não eram obrigados a arcar com determinados custos e, portanto, poderiam oferecer tarifas menores. Diante do conflito, o governo decidiu filtrar os projetos e exigiu que novos terminais apenas poderiam ser construídos por investidores que fossem movimentar carga própria em suas instalações.
 
Mas, segundo fontes que acompanham a elaboração do pacote de portos, o governo já dá sinais de que pode rever a regra para turbinar o volume de investimentos, já que o decreto acabou paralisando projetos do setor industrial.
 
Mudanças. Um empresário da área destacou que até o ex-ministro Pedro Brito, diretor da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), defensor do decreto, falou em mudanças na regra, durante evento em Santos (SP). Uma ideia é fazer licitações para os novos terminais, destaca o advogado Floriano de Azevedo Marques Neto, da Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Advocacia.
 
Na avaliação dos arrendatários de terminais de contêineres, qualquer mudança na legislação tem de vir acompanhada de compensações para eliminar as assimetrias que existem no mercado. "Os prazos dos contratos (de arrendamento e das autorizações), o custo da mão de obra e da administração portuária têm de ser iguais", afirmou um executivo envolvido nas negociações. O assunto tem ocupado boa parte do tempo nas discussões entre empresários e governo.
 
Na semana passada, vários representantes do setor se reuniram na Secretaria de Portos e Casa Civil para apresentar propostas ao governo. "Estou achando elogiável a abertura que o governo está dando para discutirmos o futuro dos portos", afirma o presidente da Associação Brasileira de Terminais Portuários (ABTP), Wilen Manteli. Segundo ele, a presidente Dilma Rousseff quer propostas para impulsionar investimentos e elevar a competitividade do País.
 
Durante esta semana, novos encontros deverão ocorrer em Brasília para afinar as ideias. Uma delas vai tratar do futuro da administração portuária, um dos pontos mais polêmicos. Hoje, parte dos portos públicos está nas mãos das Companhias Docas, estatais que não têm autonomia para gastar o dinheiro arrecadado. Em Santos, por exemplo, a empresa teria algo em torno de R$ 500 milhões, sem autorização para gastar, diz uma fonte.
 
A gestão dos portos por essas empresas é bastante criticada no mercado. Alguns executivos defendem a privatização da administração portuária. Outros acreditam que dar mais autonomia às companhias já resolveria o problema. Nesse quesito, algumas propostas estão em estudo. Uma delas é a criação de um condomínio de portos, para a iniciativa privada administrar.
 
Outra opção em análise seria a criação de um conselho de administração nas Docas, com metade dos integrantes indicados pelo governo e outra pela iniciativa privada. Esse grupo seria responsável pela nomeação dos diretores que vão administrar o porto. Além disso, os executivos teriam metas a cumprir. Nas duas propostas, o objetivo é eliminar a interferência política nos portos, hoje reduto dos partidos. Os empresários, porém, são céticos em relação à aprovação da medida.
 
Para contornar o problema o governo faria a privatização das Docas só em portos menores. Santos, o maior da América Latina, hoje loteado entre vários partidos, ficaria de fora.
 
Data: 27/8/2012