Má qualidade no transporte arranha pretensões do País

Frequentemente apontada como um dos principais gargalos da competitividade do País, a infraestrutura brasileira costuma fazer fiasco nas comparações internacionais. No ranking deste ano do Fórum Econômico Mundial, por exemplo, o País ficou em 109.º lugar em qualidade do transporte, entre 132 países avaliados. Essa fama, que certamente não combina com as perspectivas de um candidato a potência mundial, já ganhou o mundo. No fim de agosto, o jornal britânico Financial Times trouxe uma extensa reportagem sobre as condições de infraestrutura do País que sediará a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016 – e o retrato traçado não foi nada lisonjeiro.
 
O jornal afirmou que o Brasil passou anos surfando confortavelmente na valorização das commodities agrícolas e minerais e agora se deu conta de que a falta de investimentos em transportes, saneamento, telecomunicações e energia está travando o crescimento econômico. Uma das fontes ouvidas, diretor de um banco com sede na Inglaterra, afirmou que, sempre que conversa com investidores sobre o Brasil, os primeiros problemas que vêm à tona são, justamente, os entraves da infraestrutura.
 
O Fórum Econômico Mundial retratou essa preocupação ao ouvir empresários do mundo inteiro sobre as principais dificuldades para exportar. Entre os brasileiros, 21,2% mencionaram o alto custo ou os atrasos causados pelo transporte doméstico. O item ficou disparado em primeiro lugar, entre dez respostas possíveis, e alcançou o maior porcentual entre todos os 132 países incluídos na pesquisa.
 
Já em países como Canadá, Estados Unidos e China, a principal preocupação manifestada foi identificar novos compradores e mercados em potencial, enquanto os entraves do transporte doméstico ficaram, respectivamente, com 3,5%, 9,3% e 9,4% das citações. Na França e na Alemanha, lidar com a corrupção e os procedimentos complexos nas fronteiras foi o item mais votado, com o transporte doméstico sendo citado, respectivamente, por apenas 6,7% e 4,6% dos entrevistados. "As empresas brasileiras certamente precisam dedicar um esforço muito maior e gastar mais dinheiro que seus concorrentes globais para enfrentar as questões logísticas", diz o presidente da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy.
 
Ritmo lento. A Abdib analisou as estatísticas, fez as devidas atualizações monetárias e concluiu que os investimentos em infraestrutura até vêm crescendo no Brasil, mas em ritmo abaixo do necessário para que o País dê o salto esperado no prazo mais curto possível.
 
De acordo com as contas da entidade, os investimentos totais na área – públicos e privados – chegaram a R$ 173,2 bilhões em 2011, crescimento de quase 100% em relação aos R$ 90,2 bilhões de cinco anos antes. Para a Abdib, o pulo do gato será dar mais espaço aos investimentos privados, que, no período entre 2003 e 2011, corresponderam a não mais que 40% do total.
 
O governo federal deu um passo importante nesse sentido em agosto, ao anunciar um programa de concessões de rodovias e ferrovias – que, se for cumprido, resultará em investimentos de R$ 133 bilhões em 30 anos. "As rodovias e ferrovias que anunciamos hoje são muito atraentes para os investidores", disse a presidente Dilma Rousseff ao anunciar o pacote. "Meu governo reconhece que as parcerias com o setor privado são essenciais para a aceleração do crescimento, pois precisamos saldar dívida de décadas de atrasos com os transportes", acrescentou, prometendo medidas semelhantes para aeroportos.
 
Emprego. Um dos objetivos do pacote é manter o aquecimento do setor de construção civil, que se tornou um grande gerador de emprego no País, com 180 mil postos criados entre julho de 2011 e julho de 2012. Metade desses empregos veio das obras de infraestrutura, impulsionadas pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e pelos projetos relacionados à Copa – oportunidades de trabalho que se multiplicarão com o pacote de concessões, cujas obras deverão começar já no ano que vem.
 
Um dos desafios, nesse meio tempo, é amadurecer as práticas de gestão de projetos e encontrar gestores preparados para a missão. "A dificuldade para lidar com previsão de custos em grandes projetos é mundial, mas os brasileiros são especialmente imprecisos e estão sujeitos a fatores de risco, desde os sociais e ambientais até a insegurança jurídica", alerta o coordenador do curso de MBA em gestão de projetos da escola de negócios HSM, Luís César Menezes.