Governo vai adiantar 15% das receitas com ferrovias para atrair investidores

Preocupado com o pouco entusiasmo do setor privado em relação ao programa de concessões em infraestrutura, o governo anunciou  na quinta-feira (28/2) uma grande "bondade" para os leilões de ferrovias: vai antecipar aos vencedores das licitações 15% das receitas que eles receberiam nos 35 anos da concessão. Os recursos serão desembolsados pela Valec, com aporte do Tesouro. A estimativa desse gasto para os 10 mil km a serem licitados este ano chega a R$ 13,65 bilhões.
 
Para o primeiro trecho a ser oferecido às empresas – a ligação de 477 km para transportar minérios e grãos entre Açailândia (MA) e o Porto de Vila do Conde (PA) -, a antecipação de pagamentos será de R$ 477 milhões – R$ 1 milhão por km.
 
Esse dispositivo foi incluído para "melhorar a rentabilidade" do negócio, segundo o diretor da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Carlos Nascimento. O empresariado vem pressionando o governo para obter maiores ganhos com o programa de concessões.
 
As normas do leilão foram divulgadas ontem para consulta pública. Isso significa que, dependendo da reação do mercado, elas poderão ser alteradas. O conjunto definitivo das normas deverá ficar pronto em junho, disse o diretor da ANTT.
 
O governo decidiu antecipar receitas porque concluiu que a concessão ferroviária demandará investimentos elevados nos primeiros cinco anos dos contratos, período em que as linhas deverão ser construídas. Justamente nessa época, as concessionárias ainda não estarão faturando.
 
Desembolso adiantado. Como o modelo de concessões prevê que a Valec comprará toda a capacidade de transporte das novas ferrovias para depois revendê-la a quem tiver carga, a receita a ser antecipada às concessionárias será um desembolso adiantado daquilo que a estatal pagaria de qualquer maneira.
 
A diferença é que, em vez de pagar tudo depois da construção, ela iniciará os desembolsos a partir do segundo ano após a assinatura do contrato, se o cronograma de obras estiver em dia.
 
Durante reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social anteontem, a presidente Dilma Rousseff reconheceu que os investimentos previstos no plano de logística são "vultosos" e, por isso, vai trabalhar para garantir estabilidade jurídica "clara" e remuneração adequada para os investidores.
 
Segundo o diretor da ANTT, a antecipação será entregue entre o 13.º mês e o 5.º ano, quando as obras deverão estar concluídas. Os pagamentos ocorrerão a cada trimestre. No primeiro ano, a concessionária deverá manter-se com os recursos que o consórcio é obrigado a aportar e também com crédito bancário.
 
O pagamento adiantado é uma novidade em termos de concessão federal. As hidrelétricas e rodovias, por exemplo, não têm essa vantagem. Especialistas do setor acreditam que a medida adotada tem o objetivo de dar mais garantia ao gestor da infraestrutura ferroviária (no caso, a construtora) que, nos bastidores, andavam se queixando dos riscos de assinar um contrato com a Valec – estatal que tem sido envolvida em vários escândalos de corrupção.
 
Com a decisão anunciada ontem, os concessionários contam com um verdadeiro pacote de "bondades". E, conforme antecipado pelo Estado, serão autorizadas a usar os recebíveis da Valec como garantia dos financiamentos a serem tomados do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O banco financiará até 80% do valor do projeto, cobrando a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) mais até 1%.
 
Além dos R$ 13,65 bilhões de antecipação de receitas, o Tesouro poderá arcar com prejuízos da Valec na operação de compra e venda da capacidade das vias férreas. Se não houver cargas suficientes para usar 100% do que foi comprado, a estatal terá perdas.