Flávio Benatti fala sobre a atual situação da Lei 12.619

No mês passado, o Plenário do Senado aprovou o projeto que flexibiliza o descanso obrigatório dos motoristas profissionais. O PLC 41/2014 altera a Lei 12.619/2012 para aumentar o tempo permitido de direção contínua, ou seja, sem intervalos de descanso. Tal ponto é considerado pelos defensores da Lei como um dos mais importantes, pois protege a integridade do motorista e evita que ele trabalhe por muitas horas sem nenhum controle.
 
Já a jornada máxima de trabalho, que pelo projeto original da Câmara poderia chegar a 12 horas, foi mantida em 10 horas, após acordo entre os senadores. De acordo com o texto, a jornada diária do motorista profissional continua a ser de oito horas, com possibilidade de duas horas extras, totalizando o máximo de dez horas. O texto da Câmara permitia a extensão das horas extras, se decidido em convenção ou acordo coletivo, o que poderia levar a jornada de 12 horas.
 
O tempo de direção contínua, sem intervalos, ficou como no texto enviado pela Câmara. A cada seis horas no volante, o motorista deverá descansar 30 minutos, mas esse tempo poderá ser fracionado, assim como o de direção, desde que o tempo dirigindo seja limitado ao máximo de 5,5 horas contínuas. Atualmente, o tempo máximo de direção é de 4 horas contínuas.
 
A ampliação do tempo tolerado de direção contínua foi duramente criticada pelo senador Roberto Requião (PMDB-PR). Segundo ele, estudos mostram que o risco de acidentes triplica com o aumento do tempo ininterrupto de direção de 4 horas para 5,5 horas. O senador também afirmou que a sonolência ao volante causa 22 mortes por dia no país.
 
Para Requião, a mudança “legitima o genocídio” nas estradas, faz dos motoristas potenciais suicidas e homicidas e mantém a sociedade refém de um trânsito inseguro. Ele também defende que a questão econômica não pode se sobrepor às vidas das pessoas.
 
O senador Jayme Campos (DEM-MT) discordou de Requião e ressaltou que um estudo não vale mais que a experiência dos motoristas. Aplaudido por representantes da categoria, que estavam nas galerias, Jayme disse considerar que o maior responsável pelos acidentes não é a sonolência, mas as más condições das estradas.
 
“O motorista tem responsabilidade suficiente para saber se ele aguenta dirigir por cinco horas, seis horas, sete horas. Estabelecer duas horas de relógio após o almoço para descansar, nenhum motorista no Brasil quer, salvo os preguiçosos, os suga-sangue”, defendeu.
 
Ainda que aprovado no Senado, o Projeto de Lei voltou para uma nova apreciação da Câmara dos Deputados e ainda precisa ser sancionado pela Presidenta da República. Enquanto isso não acontece, vale lembrar que a Lei 12.619 continua valendo como entrou em vigor em 2012.
 
Fora do âmbito legislativo, as opiniões de caminhoneiros e lideranças também estão divididas. Chico da Boleia conversou com Flávio Benatti, presidente do Fetcesp (Federação das Empresas de Transporte de Cargas do Estado de São Paulo) , que falou sobre a situação. Confira a entrevista na íntegra.

 

Chico da Boleia: Flávio, como você vê essa tentativa de alteração da Lei?
 
Flávio Benatti: Chico, na realidade, a Lei 12.619 foi resultado de uma série de trabalhos realizados na sua construção, mas ela está longe de ser perfeita. Obviamente ela sempre precisou de ajustes e isso nós defendemos desde o começo para que essa Lei pudesse efetivamente ser cumprida. Quando se começou a discutir a necessidade de existir uma legislação especifica para o caminhoneiro, foi em virtude daquelas ações que começaram no estado do Mato Grosso, com o pessoal que transporta grãos. Nós sempre colocamos que o transporte rodoviário de cargas tem uma característica muito diferente da forma como ele vinha sendo tratado, por exemplo, pela fiscalização. Porque não havia na CLT esse capítulo do TRC, nós precisávamos então, criar um capítulo que tratasse do motorista profissional. O Ministério Público do Trabalho tem uma visão através da Constituição, das normas de trabalho e não leva em consideração as realidades do país. O TRC é responsável pelo transporte de quase 100% das riquezas do país. Quando a gente fala do transporte de grande massa, nós representamos quase 100%. E nosso país é continental! Quer dizer, não existe oferta de outros modais. Claro que nós precisávamos de uma regra que não tratasse o motorista de forma tão desumana como ele vinha sendo tratado. Nós temos casos retratados pela imprensa do motorista usar drogas e dirigir mais de 18 horas por dia. Isso não pode acontecer! O problema é que a Lei criou uma forma de descanso muito inflexível – 11 horas ininterruptas. Por isso, depois da promulgação da Lei 12.619, veio a necessidade de algumas correções para que a lei pudesse ser efetivamente cumprida.
 
Depois da promulgação levamos praticamente mais dois anos debatendo dentro do Congresso, mais especificamente na Câmara dos Deputados. Chegou-se a um consenso e a votação aconteceu. O Senado entendeu por bem fazer algumas correções nas alterações propostas pela Câmara e aprovou o Projeto de Lei. E o procedimento é esse mesmo. E agora o PL volta para a Câmara porque ele é oriundo desta casa legislativa. Então neste momento nós estamos aguardando que a Câmara aprove ou ainda altere as propostas do Senado em relação à Lei. Uma coisa é certa: com certeza esse novo texto da Lei 12.619 vem corrigir alguns aspectos que na realidade traziam um sério problema para a aplicabilidade da mesma. E é isso que nós queremos, que a Lei seja cumprida e o motorista seja respeitado.
 
 
Chico da Boleia: Nós que acompanhamos o dia a dia, sabemos que existe um embate muito grande em torno da Lei que envolve o agronegócio, as empresas e os cltistas. Foi criado o Fórum Nacional em Defesa da Lei 12619, por exemplo. Você acredita que, voltando para a Câmara é possível um consenso ou ainda haverá muita disputa em torno da Lei?
 
Flávio Benatti: Eu acredito num consenso porque, na realidade, a criação do Fórum em Defesa da Lei 12.619 estava um tanto quanto inflexível, pois querem a Lei como ela foi criada em 2012. Como eu disse antes, isso é impossível, porque não se consegue aplicar essa norma. Eu acredito sempre num consenso. Os homens são inteligentes o suficiente para encontrar um ponto de equilíbrio. Até os noventa minutos e mais a prorrogação é sempre possível encontrar ajustes e entendimentos.

 
Chico da Boleia: Falando agora do mercado. Nós começamos 2014 com o mercado aquecido, agora há certa queda nesse quadro e muita gente preocupada com o resto do ano. Você, com sua experiência, como avalia o segundo semestre deste ano para o TRC?
 
Flávio Benatti: Na realidade o transporte vive exatamente um crescimento. O que nós estamos observando, lamentavelmente, é que há da parte do setor produtivo certa preocupação com o próprio andar da carruagem e com a política econômica. Essas incertezas fazer com que o setor empresarial recue em investimentos. E nós estamos terminando uma Copa do Mundo e entraremos numa disputa eleitoral, ao que parece, muito acirrada. Eu acho que esse ano é muito preocupante em matéria de crescimento no segundo semestre. Mas devemos manter os níveis e eles nos apontam um crescimento, se houver, muito baixo. Acho que é um momento de transição, de sermos um pouco mais “conservadores” em matéria de investimento e analisar com muita cautela os negócios que vamos fazer.

Link da noticia pibçicada em 8 de julho: http://www.chicodaboleia.com.br/index.php/flavio-benatti-fala-sobre-a-atuacao-situacao-da-lei-12619/
 

8/7/2014