Baixo nível da hidrovia Tietê-Paraná interrompe o transporte de grãos

O braço de transporte hidroviário da DNP Indústria e Navegação era a empresa com maior volume de carga atuando na hidrovia Tietê-Paraná, que percorre diversos municípios do interior de São Paulo. Nos cinco primeiros meses do ano, a empresa transportou 300 mil toneladas de soja em viagens de mil quilômetros de extensão. Mas veio a interrupção da hidrovia em fim de maio e a parada dos seus trabalhos.
 
Naquele mês, o nível de parte da hidrovia tornou impossível a passagem de navios com o calado necessário para realizar o transporte de grãos de Goiás para perto da Grande São Paulo. Os problemas com trechos de alta dificuldade em navegação, contudo, começaram ainda em fevereiro.
 
De julho para cá, a DNP demitiu cerca de 700 funcionários. "Secaram todos os lagos que abasteciam as duas geradoras de energia com barragens na hidrovia, que são as usinas de Três Irmãos e de Ilha Solteira. Precisaria, no mínimo, que o nível médio subisse seis metros", diz Nelson Michelin, presidente da DNP. "Para este ano, esquece. Não tem mais como navegar mesmo se vier um verão com chuva muito acima da média", complementa.
 
Michelin diz que oferece o serviço na hidrovia há 25 anos e que nunca tinha visto uma seca como a de 2014. "A hidrovia sempre foi precária, todo ano temos problemas com ela. O mais comum era no trecho paulista entre Anhembi e Pederneiras, por causa da poluição da capital, que deposita sedimentos em uma das curvas do rio, reduzindo o calado. Mas mesmo assim havia jeito de passar", afirma.
 
Os técnicos de navegação da empresa relataram nos últimos anos a diminuição do volume médio dos lagos que alimentam o rio Tietê no interior paulista. "Faz mais de dez anos que todo ano cai o volume. Isso [a seca na hidrovia] não é algo que aconteceu do nada", diz Michelin, lembrando que no ano passado a DNP transportou 3 milhões de toneladas de soja, que geraram divisas em exportações de cerca de US$ 2,5 bilhões.
 
Com a inutilização da hidrovia, as tradings de grãos, que correspondem por grande parte do volume transportado anualmente pela Tietê-Paraná, passaram a usar o transporte rodoviário para escoar a produção, uma alternativa mais cara. Estima-se que o custo do frete hidroviário é um terço do valor do rodoviário.
 
A Cargill é uma das grandes que recorreram a essa mudança. Altamir Olivo, gerente de logística da Cargill, confirma a mudança e o aumento dos custos com o frete rodoviário. Segundo ele, como as vendas já estavam amarradas por contratos, não houve como a empresa segurar os embarques para esperar que a hidrovia voltasse a funcionar. "Tínhamos compromisso com clientes a atender", explica. Procuradas pela reportagem, a ADM e a Bunge, que também utilizavam a hidrovia, não se manifestaram.
 
A Caramuru Alimentos, cliente da DNP e uma das maiores processadoras de grãos do país, foi uma das empresas que entraram na Justiça contra os governos federal e estadual em razão da interrupção da navegação da hidrovia. Mas Michelin é descrente sobre possíveis frutos que a judicialização sobre o tema possa dar. Mesmo assim, sua empresa tem cinco ações sobre o assunto na Justiça, algumas tendo como co-autores outros clientes, como a própria Caramuru.
 
Apesar do impacto no transporte de grãos, o deslocamento de areia e de cana de açúcar, por exemplo, tem ocorrido normalmente, segundo o comandante Márcio Costa Lima, da Capitania Fluvial Tietê-Paraná. Ele explica que esse tipo de transporte não usa longos trechos da hidrovia, mas percorre distâncias mais curtas, muitas vezes entre um município e outro, em pontos do rio nos quais a navegação ainda é viável.
 
O comandante conta que, no trecho da hidrovia que liga São Simão, em Goiás, à paulista Pederneiras, há apenas um trecho, próximo ao município paulista de Buritama, que está com a navegação interrompida. Nesse ponto, houve redução do calado máximo da embarcação desde abril e, em fim de maio, a navegação foi interrompida. A profundidade do rio, nesse trecho, está cerca de cinco metros abaixo do nível considerado viável para navegação de cargas, de acordo com as normas de segurança.
 
O transporte de cargas mais afetado foi o da soja que, vinha do Centro-Oeste e seguia até Pederneiras, onde era deslocada para os trens que levam os grãos até o porto de Santos. Segundo o governo estadual, a estimativa inicial para o ano era de que a hidrovia transportaria 8,1 milhões de toneladas em carga. Com a navegação suspensa em um dos trechos, a previsão atual é de que o volume fique em 4 milhões de toneladas.
29/9/2014